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Entre o ser e o estar

01 de novembro, 2016 - por Max Franco

Aqui e ali.
Cá e acolá.
Sempre em trânsito. A mala, bicho de estimação, à mão. Está indo ou voltando? Para onde? Quem saberia habitar no gerúndio? Quo vadis, domine? Nenhum lugar onde a palavra casa possa ser usada com c maiúscula.
Tenho amiúde a sensação estranha de estar meio de chegada, meio de partida não sei exatamente para onde. Onde você mora? Dá vontade de responder “na rua”. Em qual rua? Não na rua, mas no caminho, no meio dos lugares, na estrada entre um e outro, moro num durante, amigo. Moro num intervalo, no meio de um entre. Rua Por enquanto, sem número. Sem lugar. Endereço ignorado. No limbo. Naquele espaço ignoto entre dois mundos. Eu não estou em trânsito. Eu sou. Meu nome é traslado, e a minha pátria, deslocamento. Eu não estou, eu chego, eu vou. Eu sigo, mal paro, dessigo. Volto sobre as minhas pegadas e as apago com meus pés. Já não sei meu onde, o onde é o percurso. Voltando para lá ou partindo para cá? Tem dias que faria tão bem se estar e ser se encontrassem na mesma esquina!
Sabe seu endereço? Sei. Sei até o cep. Mas não tenho morada. Tetos me tem de visita. Entre os estados, o meu estado é passageiro.
O que é estranho? O opaco, a névoa, a neblina que se deitam sobre as localidades, fotografias amareladas pelo tempo. Eu tento tocar, pegar, abraçar as imagens. Mas, elas desvanecem, nuvens espalhadas pelo espaço. Tempo e espaço, muros erguidos entre ontem e hoje, entre o que fui e sou, entre uns e outros. Há sempre tanta coisa no entre.
Eu sei que é clichê mas foda-se se for porque não há mesmo forma melhor de dizer que tanta vez não há presença maior do que a presença da ausência. É uma ausência física, concreta e completa. Um oco táctil. Uma lacuna de envergadura sólida, com cheiro e largura, com a dimensão de todo o vazio do mundo. Houve um tempo que apelidei essa ausência de saudade. Mas saudade é só um nome. O que eu sinto hoje é dicionário.
Não estou reclamando. Ninguém deveria maldizer as escolhas que fez. Apenas, relato e registro. Na minha vida, fiz sempre de mim o maior laboratório. Um cientista louco fazendo de si a cobaia das suas mais loucas experiências. Testei isto e aquilo para ver o que dava. O que sentia, como reagia. E como os fatos repercutiam em mim. E repercutem. Nem sempre doem ou agradam na hora. Há horas de anestesia, efeitos colaterais e resultados retardados. Mas nada na existência passa incólume.
– Não há nada em viver que seja inofensivo.