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Efeito Mandela: as memórias que não temos
20 de dezembro, 2021 - por Max Franco
Já lhe aconteceu de você e seus amigos se lembrarem com clareza de um fato ou evento, mas, por fim, descobrirem que ele nunca ocorreu?
Não fique nervoso caso algo do gênero já tenha lhe ocorrido, você não enlouqueceu (ainda!). Há uma teoria que tem ultimamente sido alardeada e que foi batizada como “Efeito Mandela”, um fenômeno que acontece quando um grupo compartilha memórias de fatos que nunca ocorreram. Nestes casos, algumas pessoas passam a se lembrar, inclusive com detalhes, de vidas que nunca tiveram, o que os levaria a tomar decisões equivocadas.
Você – por acaso – já cantou o sucesso de Cláudio Zoli, Noite do Prazer? Na madrugada vitrola rolando um blues, tocando B.B. King sem parar. Confesse: você não escutava “B.B. King” de jeito nenhum. Você cantava “trocando de biquini”, não é verdade? E há outras músicas que você também cantou de maneira errada durante muito tempo.
Você já fez ou ouviu perguntas do gênero: “O quê? Ele ainda está vivo?” É comum ouvir essa frase, seja em um encontro de família ou em uma noite com os amigos no bar. É frequente alguém acreditar que se lembra de um fato que, na realidade, não aconteceu daquela forma. As falsas memórias existem, porém não são fenômenos individuais. Grandes grupos também podem se lembrar de coisas que jamais ocorreram ou não ocorreram daquele jeito. Isso é o que se convencionou chamar de efeito Mandela.
A denominação, por sua vez, advém do fato de muitas pessoas pensarem que Nelson Mandela teria morrido na prisão. O que não é verdade. Mandela foi libertado em 1990 e se foi presidente da África do Sul entre 1994 e 1999. Quando a notícia da sua morte, em 2013, circulou pela mídia, muita gente ficou espantada, pois se lembravam de imagens anteriores de seu funeral na televisão.
Mesmo que pareça impossível, ocorrências nas quais grupos se lembram coletivamente de determinados fatos de modo incorreto é um fenômeno comum. Há relatos disso em todos os países, seja em relação à música, ao cinema ou a personalidades públicas, nada nem ninguém está a salvo do efeito Mandela.
Muita gente sabe a letra e canta junto os últimos versos da famosa balada do Queen “We are the champions”, entretanto, a conclusão com “of the world” é uma invenção do público. A Letra original não é assim. Freddie Mercury aderiu ao final errado adicionando “of the world” à letra nas apresentações ao vivo. Darth Vader tampouco diz: “Luke, sou seu pai”, como muitos atribuem. Quando Luke Skywalker diz que Darth Vader havia matado seu pai, Vader responde: “Não, eu sou o seu pai”.
Há outros exemplos de efeito Mandela em todo o mundo. Como, exatamente, eles surgem, não tem sido amplamente pesquisado. Fato é, no entanto, que o cérebro humano pode se confundir com facilidade. Nossa mente não funciona como um computador nem sempre podemos acessar às memórias das quais precisamos, e muito menos conseguimos lembrar de tudo nem de como aconteceram as coisas das quais lembramos. Os fatos vão se fundindo, misturando e enevoando facilmente. Chega a ser fácil plantar falsas memórias na cabeça por meio de histórias distorcidas, mas compreender como milhões de pessoas podem chegar às mesmas lembranças equivocadas, é outra coisa.
A questão é o mundo nos conta histórias que jamais aconteceram ou que não aconteceram daquela exata forma. Entretanto, nós também nos contamos histórias equivocadas. Estamos sempre escutando, lendo e tendo acesso a todo tipo de narrativas que acabam nos influenciando de inúmeras formas. Além disso, somos movidos por diversos fatores e fenômenos: escotoma, efeito bolha, fake news, histeria coletiva, efeito Dunning-Kruger, lavagem cerebral ou por mera burrice mesmo (https://www.maxfranco.com.br/artigos/as-historias-que-contamos-para-nos-mesmos/). A verdade, portanto, é artigo raro, seja porque nos contam histórias equivocadas, seja também porque nós as contamos para nós mesmos.
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