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Eu sou

08 de maio, 2016 - por Max Franco

Belo Horizonte, 9.5.2016

Eu sou vermelho.
Sei que é uma das confissões mais íntimas e reveladoras que já fiz. Declaração, inclusive, que me pode gerar não sei quantas interpretações, de todas as naturezas.
Pessoalmente, não conheço outro que fale da sua pessoa tratando tanto da minha quanto Pessoa.
Quanto mais Pessoa fala de si, mais fala de de mim.
E eu seria Pessoa caso pudesse ser outra pessoa.
Pois eu também sou eu e minhas circunstâncias.
Nestes anos nos quais vago por aí, aprendi algumas coisas sobre o ato de ser e, principalmente, de ser ao lado de outros seres.
Aprendi que ninguém é só. Somos em companhia.
Eu, caso vivesse eremita, desde os tenros anos, em ilha deserta, fatalmente não seria eu quem sou. O “eu” pessoa física, instaurado, oficializado, determinado, seria tão diferente que, poderia até ter meu nome, meu RG e minha cara, mas seria longe de ser eu. Então, de fato, eu como sou e com a minha forma de ser, pensar e agir, não existiria. Eu, portanto, sou o que vivi, vi, senti e, bastante, o que fiz e me fizeram.
Eu sou a soma de tudo, e a subtração de tanto. Afinal, o que não me passou também me fez.
Nesta conta, hoje, depois de tantos cálculos e circunstâncias, sei que sou um bocado do que desejara ser e muito que nunca nem sequer cogitei. Anos atrás, se me previssem coisas que fiz no futuro ou que sou no presente, muita coisa me seria sinal de surpresa. Algumas felizes, outras, nem tanto.
O fato é que sou vermelho. Quando sou o melhor de mim, consigo manter um vermelho vivo, mas sem vermelhidões inflamadas. O rosa opaco também não interessa. Atualmente, é só isso que desejo de mim: manter o equilíbrio da minha tonalidade. Porque vermelho demasiado ofende e de menos passa em branco.
Espero, no entanto, que não me pretendam verde ou azul. Vermelho sou – gosto da minha vermelhitude – e sempre serei. As cores alheias podem e devem me trazer outros matizes, mas nunca me sequestrar a minha cor.
O problema é que, habitualmente, ocorre um equívoco comum: quem é amarelo, quer o outro, o mundo, se possível o céu, também amarelo. Gente amarela sai de casa com intuito de amarelar o planeta. Que mundo chato seria este todo amarelo.
É aconselhável, então, por todas as razões, antes de tudo, descobrir qual é a sua cor e tratar de controlar a sua intensidade, ao mesmo tempo em que cuida de perceber a dos outros e, é claro, de respeitar a pigmentação alheia. Cada um tem a sua cor. Não exagere na sua para não sujar a do outro. Deixe-se mesclar para evitar o monocromático. Perca um pouco das suas tintas misturando-se com as dos outros. E assim você deixa o mundo mais colorido. Perdendo-se sem se perder, mas se desmanchando um pouco, se diluindo, se espalhando.
O problema acontece quando pensamos o outro verde e, de repente, o descobrimos azul-piscina ou pink. Aí não adianta puxar o pincel e querer modificar o sujeito. Uma vez azul, sempre azul. Mesmo que tonalidades mudem aqui e ali, antes ou depois, mas sempre azul.
É o que digo sempre: o maior erro é o do nosso GPS interno. É um equívoco de endereço. A gente quer encontrar uma farmácia e acaba numa padaria. Não vai adiantar pedir diazepan. Você vai cobrar, vai chorar, vai implorar. Mas, padaria é padaria. A gente se decepciona porque erra a localização.
Alguém me dirá, no entanto, que existem os marrons que se dizem azuis, agem como azuis, falam como azuis, mas, no fim, são marrons. Eu conheço estes camaleões e, lhe digo, meu amigo, não há como evitar estes encontros. Decepções são naturais na lida de viver. Sugiro-lhe apenas que mantenha sempre limpas as suas lentes. Tente apurar o olhar para facilitar a identificação dos répteis que lhe cruzarão o caminho. Eu topei com vários, mas, hoje – acredito – enquanto a minha vista piorou, o meu localizador nunca esteve tão apurado.