A verdade é aquilo que, quando você para de acreditar, ainda existe. (Phillip Dick).
No período de pandemia, me dediquei a ler algumas distopias que são famosas no mundo da Literatura. Li Orwell e o seu doloroso 1984. Li Fahrenheit 451, do Ray Bradbury. E outros tantos. Entretanto, em nenhumas dessas obras, os autores, por mais criativos e pessimistas, que tenham sido – e foram – eles previram algo tão insidioso e malévolo quanto as redes sociais. Nenhuma das distopias do mundo da ficção conseguiu profetizar o que o mundo se tornaria sob o jugo da internet.A questão é que a humanidade teve acesso a poder e capacidade difusão de ideias de mais, porém com educação e responsabilidade de menos. De tal forma que as redes sociais se transformaram em fuzis nas mãos de crianças inconsequentes.
Stephen Biko, ativista dos direitos humanos na África do Sul, dizia que “A arma mais poderosa nas mãos do opressor é a mente do oprimido”, e é logicamente verdade. Os opressores, geralmente, estão em menor número. Eles precisam, portanto, recrutar de alguma forma alguns oprimidos para ajudá-los na sua dura tarefa de “manter nos seus lugares” aqueles que, porventura, não aceitem mais ficar na fila do osso. Harari vai chamar este processo de “cascata de privilégios”. Em outras palavras, preciso distribuir algo mais para aqueles que me apoiam sob o risco de perder lealdades. O capitão do mato do período escravocrata é um bom exemplo desse papel. Mas, atualmente, temos mais e são tantos que vestem muito bem este fardamento.
O mesmo ocorre com o usuário das redes sociais. Afinal, ele é, ao mesmo tempo, vítima e algoz dos seu atos.
A mentira sempre existiu. Ela deve ter nascimento no exato momento em que inventamos a palavra. Na natureza, o único ser que mente é o homem. Todo o resto diz a verdade. Por isso, lidamos com a mentira faz tempo, mas, a cada dia que passa, demonstramos menos que estamos preparados para lidar com ela e com os seus nefastos efeitos.
O problema dos dias atuais, porém, é a mentira elevada a milésima potência, a mentira disseminada pelos algoritmos, engajada pelos robôs, patrocinada, customizada, bancada pelos interesses mais vis.
Como se vacinar contra as fake news? Como erguer as defesas necessárias para evitar cair nas armadilhas que essas artimanhas nos preparam?
Storytelling é uma técnica de persuasão. É uma história, uma narrativa, montada para convencer as pessoas. Pode ser uma mentira? Claro que pode. Não deveria, porém. Por quê? Simples: porque não é ético. É sempre bom lembrar que ideologias que foram (e ainda são) nocivas para a humanidade são variantes de aplicações distorcidas de storytelling, tais como a eugenia, o fascismo, o nazismo, a escravatura, entre outros.
As sociedades contemporâneas não estão sabendo lidar com as fake news. Todo mundo já sacou essa situação. Entretanto, seja qual for a solução – se é que vai existir solução para esta grande cilada na qual nos metemos – deve passar por políticas poderosas de Educação e, decerto, por alguma punição para quem constrói e espalha desinformação e fake news. Como vai funcionar este modelo é o que não sabemos. Mas sabemos que precisamos fazer algo para que não sejamos devorados pelo monstro que nós mesmo criamos e engordamos e fortalecemos.
Precisamos urgentemente de Verdades, nem que sejam incômodas.
E a verdade tende a ser incômoda para alguém.
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