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Eu passarinho
03 de abril, 2016 - por Max Franco
Há denominações que naturalmente podem ser empregadas contra mim e coisas das quais posso ser acusado. Algumas, injustamente. Outras (glória a deus), com certa razão. mas, entre todas – certamente – ninguém pode alegar que eu goste de Paulo Coelho.
Não, amigos. Eu tenho defeitos. De alguns até gosto. De outros, odeio. Preferiria trocá-los por algumas virtudes de estimação. Preferiria algumas qualidades civis, mesmo postiças, mas que me caíssem bem, como torcer comedido pelo Vasco da Gama, não palitar os dentes à mesa ou alguma capacidade de não expressar sempre – estampados na minha cara em neon – os meus (piores) sentimentos.
Porém, não pode me ser atribuído qualquer apreço a Paulo Coelho. Por ele, tenho só inveja. Das piores. De todas as cores.
Entretanto, sem fazer apologias, me ocorre ordinariamente na vida algo que me faz lembrar de algo que li do afamado autor.
O livro se chama ” Às margens do Rio Piedra, eu sentei e chorei”. Eu li e chorei também, de tão ruim que é. Li para isso mesmo. Eu criticava o autor sem a propriedade de tê-lo lido. Coisa das mais levianas. Hoje – sim – posso descer o pau.
Contudo, há uma historinha no livro que é muito boa. Não sei se conseguirei me lembrar com exatidão o episódio, por isso irei reproduzi-lo como me recordo.
Havia este casal que estava fazendo uma viagem pelo interior da Espanha. Eles viram uma igrejinha à beira da estrada e decidiram encostar para conhecê-la. À porta da igreja estava sentado um senhor. A dupla deu bom dia e fez menção de entrar no pequeno templo. Foi aí que o velho decidiu interferir.” Não podem entrar! Ainda não está aberta para visita”. O rapaz questionou. “Mas, por quê?”, “Só abre as onze”, “Mas, são dez e meia…Deus marca hora para receber reza?”, “Só pode entrar onze!”
O sujeito, então, não se fez de rogado, interrompeu o debate, pegou a mão da moça, empurrou a porta encostada e entrou na igreja. O velho, por sua vez, continuou resmungando lá fora.
Voltando ao carro e seguindo pela estrada, a garota perguntou para o namorado: “Por que você fez isso?”, “Porque a pior coisa que eu poderia fazer era continuar a discussão. era isso que ele queria. Queria uma desculpa para uma crise. Há gente assim, sabe? Gente que talvez esteja atravessando algum drama. Que está infeliz. Que se incomoda com algo que talvez você tenha, ou pareça ter. Que encena uma peça pessoal, um roteiro próprio. Ele queria me arrastar para a sua intriga. Queria me infectar com o seu recalque. Desejava me contagiar com os seus ressentimentos. A opção de me deixar levar, porém, era minha, só minha. Eu não deixei e segui o meu caminho, não o dele.”
Essa é a historinha. É um fato recorrente. A gente sempre topa com pessoas assim, não é? Com pessoas mal resolvidas, azedas, ressentidas, sempre elocubrando alguma intriga, sempre cevando angústias. gente infeliz não suporta a felicidade alheia Não vale a pena cantar no tom delas. Na verdade, quanto mais distante de figuras assim, melhor. Você já tem os seus problemas. Não precisa pegar emprestado os dos outros. A opção de encenar a peça do outro é sua.
Eu – sinceramente – devo dizer: ando empurrando as portas e dando ouvidos moucos aos intriguistas. Os resmungões que resmunguem. Não tenho vontade de perder nem tempo nem energia com susceptibilidades desta laia. Minha paz é preciosa demais.
Como eu sempre digo, sempre, a maior vingança é ser feliz!
E como diz Quintana – este sim, gênio – ” Todos estes que aí estão atravancando o meu caminho. Eles passarão. Eu, passarinho.
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