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Não olhe para cima

31 de dezembro, 2021 - por Max Franco

Storytelling é um método, uma técnica que faz uso de narrativas, que tem por intuito persuadir alguém ou um grupo de pessoas. O Storytelling é uma ferramenta que pode ser usada tanto para para se dizer a verdade quanto para mentir. Portanto, o bom storyteller é aquele que consegue convencer as pessoas fazendo uso de histórias, fábulas, alegorias, parábolas ou metáforas.

Se nos detivéssemos em uma análise fria, sem viés moral, talvez chegássemos à conclusão de que toda mentira é, a rigor, storytelling, enquanto a verdade não, ao menos não obrigatoriamente. Conhecimento científico não é opinião, não está assentado em ideologias nem em religiões.  A verdade é fato e fatos não precisam de narrativas para se manterem de pé, porém talvez precisem para serem conhecidos, entendidos, aprendidos.

A questão é que a modernidade, por inúmeros motivos, oferece um maquinário poderoso para fomentar e alardear fake news, teorias conspiratórias e narrativas que funcionem como cortinas de fumaça. “Não olhe para cima”, o novo filme da netflix é um exemplo de governos e corporações fazem uso atual do storytelling pelas causas mais escusas.  “Não olhe para cima” se tornou o mais assistido no mundo e o primeiro lugar na lista de mais vistos no Brasil, ao mesmo tempo em que se se transformou numa grande polêmica, principalmente pelas óbvias associações com as práticas de alguns governos aqui e ali.

Não é de hoje, afinal, que política, dinheiro e poder lançam mão de narrativas a fim de se prevalecerem.

“Não Olhe Para Cima” conta com atores renomados em seu elenco: Leonardo DiCaprio, Jennifer Lawrence, Meryl Streep, Kate Blanchet, Timothée Chalamet e Jonah Hill. Não há mais necessidade de se tratar do enredo, o qual já é de conhecimento geral. O foco aqui é demonstrar como o storytelling é utilizado na sátira com o intuito de denunciar as práticas negacionistas da extrema-direita, principalmente, quando se trata de questões climáticas, mas que acabaram sendo tão cotidianas durante a pandemia, afinal, o período foi (ainda é) um terreno fértil para todo tipo de teoria da conspiração e, obviamente, para os barulhentos antivax.

A verdade é que temos, no filme, storytelling ao dobro, metalinguístico, porque temos uma ficção tratando de como as narrativas são construídas e para que são construídas.

“Não olhe para cima” seria uma tragédia se não fosse pela comédia. Ou o contrário.

É sempre doloroso ver no que nos transformamos nesse futuro fajuto que nos foi prometido tão evoluído. O fato é que somos governados por personagens caricatos, histriônicos, os quais, na verdade, não são cômicos nem sequer trágicos.

São pequenos mesmo.