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Você não é substituível
10 de maio, 2017 - por Max Franco
Há aquele famoso episódio dos sujeitos que entram no cemitério, quando um fala para o outro: “Aqui jaz um bocado de gente insubstituível!”.
Seguindo este pensamento, meu amigo, concluímos que todos não passamos de meras peças de reposição uns dos outros. Entretanto, para contradizer a afirmativa, me recordo que faz, hoje, uma semana, da morte do grande músico e compositor cearense chamado Belchior. Estou seguro de que há músicas de Belchior que tocarão enquanto as pessoas tiverem ouvidos. Alguém por aí acha que Belchior será substituído?
Faz anos que ouço a mesma fanfarronice sobre um bocado de gente “substituível” que nunca foi substituída. Quem substituiu os Beatles? Ou Pelé em campo? Quem substituiu Mozart? Ou Senna? Quem foi colocado no lugar de Saramago, Pessoa, Drummond, Ariano ou Jorge Amado? Basta um ator de valor sumir do palco, para que alguém vaticine um sucessor prontinho nos bastidores. Pois eu digo, ninguém foi alçado ao posto de nenhum destes, nem será.
Na verdade, a rigor, ninguém, absolutamente ninguém, é substituível. Peças de carros e engrenagens de computador – essas sim – são facilmente substituíveis. São feitas em série. Tem números para identificá-las. Podemos encontrar iguaizinhas nas casas dos respectivos ramos. Gente, não.
Quem foi que substituiu o meu pai quando ele morreu 17 anos atrás. E olha que o velho não compôs nenhuma música nem fez mais de mil gols. Meu pai não era famoso nem inventou a cura para alguma doença. Mas o marinheiro era um cara extraordinário. Sabe para quem? Para mim. Ele fez, afinal, o que ninguém mais fez: a mim!Como ele não seria, para mim, para meus irmãos e para aqueles que o amavam, especial? Era um indivíduo totalmente fora do comum, porque o comum, o ordinário é não ser meu pai. Só ele foi. Portanto, ele era muito, muitíssimo, insubstituível. Ninguém tem o direito de dizer que ele era dispensável. Ou que eu sou, ou você é. Ninguém que é amado é substituível. Não há peças de reposição para eles. Não há ninguém no banco à altura para entrar no campo nos seus lugares.
Estamos vivendo num mundo muito complicado e entendo a intenção de alguém quando diz “Você não é insubstituível”. É lógico que ninguém deve se achar a última bolacha do pacote. Humildade é mais do que importante, é essencial, tanto profissional quanto humanamente. Porém, é igualmente importante que possamos reconhecer o valor do outro. Eu diria que, atualmente, pecamos muito mais por falta de palavras de reconhecimento do que por excessos de elogios (a não ser para chefes. Chefes são seres elogiáveis por excelência!).
Nestes anos de atuação profissional, – devo dizer – trabalhei ao lado de pessoas completamente insubstituíveis. Sujeitos que morreram, mudaram de empresas ou se aposentaram, mas que jamais foram substituídos realmente. Outros ocuparam as suas funções, apenas. Tinham outros predicados. Mas nunca os mesmos.
Por isso, lhe digo, meu amigo: você não é substituível! Por isso, não se isente de deixar, no seu trabalho e nas pessoas com as quais convive, as suas marcas. Só você pode deixá-las. Só você pode ser pessoalmente, distintamente, inconfundivelmente você. Ninguém fará igual. Só você é o legítimo você. Como eu, só você sabe como é calçar os seus sapatos, sabe dos acertos que cometeu e dos erros que cometeu. Ninguém mais erra e acerta com a sua originalidade e da sua maneira.
Eu tenho visto muito, meu caro. E tenho sentido mais do que tenho visto. Há muita frieza e inveja e antipatia e desimpatia nesse mundo. Não contribua com mais. Não tenha medo de ser quem você é e da melhor forma que pode. Mas, aproveite também e contradiga toda essa corrente de indiferença que se avoluma por aí, então, se aproxime do seu colega de trabalho, dos seus amigos, dos seus irmãos, daqueles que são insubstituíveis, olhe nos seus olhos e tenha coragem de lhes dizer o que eles significam para você. Que ninguém ocupará os seus lugares na sua memória e no seu coração. Fale, antes que seja tarde. Antes que as palavras se extraviem. Antes que as pessoas se percam nas esquinas das cidades.
Porque só importa o amor que se tem nessa vida e o amor pelas pessoas que nos são irremediavelmente insubstituíveis.
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