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Do exílio

25 de janeiro, 2020 - por Max Franco

Estrada.
Já faz tempo que a minha alma está encharcada de estrada.
A vida no exílio não é um troco que você deixa para o garçom.
A vida no exílio é esforço cotidiano de saber o que esquecer e o que não se pode deixar de lembrar.
É sempre perda e dano misturado com gana e ganho.
Às vezes acho que a minha alma se assemelha às curvas dessas estrada de mato seco e solo escaldante.
Pé-de-pau para rasgar esse chão e se manter teso na terra tem que ser obstinado, talvez fanático, desesperado pela vida.
A vida é assim. É essa sucessão de estar um na frente do outro.
A vida é feita desses estados latentes e imperfeitos e transitórios e imanentes, todos perfilados.
Até o dia em que o estado deixar de estar, e de ser.
REM me murmura nos ouvidos o seu “Everybody hurts”.
É claro que hurts…
Paro o carro para comer os cajus e roubar o doce da terra e algum ranço, porque há sempre ranço.
Lavo o rosto e a cabeça como se pudesse também lavar junto algum passado e purificar qualquer futuro.
Mas passado é impermeável, não é? Passado é à prova d’água, ilavável. Passado não se lava. Passado se lida.
Segue a estrada.
Mentira.
Estrada não vai para canto algum. Estrada é canto.
Eu que sigo na estrada, nessas estradas, alma entupida de estrada até a boca.
Ninguém ao lado a não ser essa solidão muda.
Muda não. Mentira mais uma vez.
A solidão canta “Everybody hurts”.